A DERROTA DOS MANUFATURADOS
Agronegócio brasileiro continua sua marcha de sucesso, ultrapassando continuamente seus excelentes resultados, tanto assim que suas exportações registraram recorde mensal histórico no mês de março passado, ao atingirem US$ 11,5 bilhões.
Novamente, as locomotivas dessa performance são o complexo soja, o setor de carnes (também registrando recorde) e açúcar.
Como o resultado de qualquer processo é normalmente consequência de seu começo, o excelente desempenho do setor de carnes se iniciou na consolidação da pecuária.
No final do século XX, ano 2000, o rebanho bovino brasileiro registrava 146 milhões de cabeças, chegando a 2020 com 215 milhões (aumento de 47%).
A determinante contribuição da pecuária não se limitou somente ao aumento quantitativo, mas principalmente na pulverização de diversas melhorias qualitativas: genética, alimentação, aumento de peso (+30%), gado zebu, controle da aftosa, redução na idade do abate (4 anos para menos de 2 anos) e outras conquistas e investimentos que alicerçaram a inserção competitiva da carne bovina brasileira no exigente mercado internacional.
Por conseguinte, o sucesso da carne brasileira resulta, em grande medida, da visão empreendedora e das atitudes desafiadoras que se alastraram na pecuária nacional.
Maior competitividade e maior demanda culminaram com elevação dos abates nacionais. Limitados, no ano 2000, a cerca de 20 milhões de cabeças, os abates chegaram a 2020 ultrapassando os 40 milhões de cabeças (aumento de 100%).
Os avanços implementados, há pelo menos uma década e meia, transformaram o Brasil em global player da cadeia da proteína animal e mais do que duplicaram a importância relativa do país no mercado mundial.
Mas, nem tudo que reluz é ouro.
As medidas setorialmente positivas que ensejaram as evoluções hoje celebradas, foram também responsáveis por indesejados efeitos colaterais que desestimularam importantes segmentos econômicos.
Em 1995, o governo Fernando Henrique Cardoso, em início de mandato, orientou a formatação e articulou a aprovação da Lei Kandir, focada na desoneração da produção primária. O resultado, como esperado, promoveu relevante queda na arrecadação.
Para compensar, o governo criou injustificada assimetria e tributou o processamento, onerando a agregação de valor. Os acertos da escolha anterior não chancelariam ao governo optar por complementação tributária estruturada em equívoco também primário.
A decisão resultou desastrosa para a manufatura e derrubou pela metade a participação da indústria no PIB brasileiro.
O Brasil passou a disputar liderança mundial em setores primários, desenvolvendo inaceitável apreço pela desindustrialização e, a partir de então, regra geral, a equação comercial brasileira protagoniza, como inevitável sequela, a exportação de commodities.
Luiz Bittencourt – Eng. Metalúrgico/UFF; M. of Eng./McGill University/Montreal/Canadá; Pós-graduado em Comércio Exterior/Universidade Mackenzie/SP; Consultor em Relações Institucionais; Diretor da LASB Consultoria –[email protected]
Hélio Mendes – Consultor de Estratégia e Gestão, professor da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, com curso de Negociação pela University of Michigan, Gestão Estratégica pela University of Copenhagen e Fundamentos Estratégicos pela University of Virginia. [email protected] – www.institutolatino.com.br