DIFÍCIL CENÁRIO PARA O COURO BRASILEIRO
São públicas e notórias a redução das atividades econômicas, decorrentes das medidas para o enfrentamento do Covid-19, e a consequente imprevisibilidade que acomete os procedimentos decisórios dos atores econômicos.
O ambiente é nebuloso, repleto de incertezas e de obstáculos, alguns aparentemente intransponíveis.
De forma geral, a atmosfera pandêmica encolheu o comércio exterior brasileiro, parcialmente afetado pelas restrições, reduzindo suas exportações em 39%, se considerarmos os resultados do primeiro trimestre, no período de 2019 (US$ 51 bilhões, sem coronavírus) a 2021 (US$ 31 bilhões, com coronavírus). Em 2020 (US$ 48 bilhões, com coronavírus) ocorreu, no mesmo período trimestral, relevante inflexão na curva das exportações brasileiras, que vinha apresentando crescimento anual, e terminou por obter resultado em 2021 (US$ 31 bilhões, com coronavírus) inferior ao obtido em 2016 (US$ 40 bilhões, sem coronavírus).
A redução nas exportações brasileiras é exclusividade da pandemia e ocorre em modelo simples, onde cessada a causa, cessam os efeitos. Infelizmente, não é o caso da indústria brasileira do couro, submetida a um conjunto de causas, algumas delas não tão aparentes, mas com incrível poder deletério.
Desde 2014, quando alcançou o recorde de US$ 2,9 bilhões nas exportações, o setor curtidor brasileiro iniciou trajetória de perda de mercado, chegando em 2019 com exportações de US$ 1,1 bilhão (sem coronavírus) e de US$ 0,9 bilhão em 2020 (com coronavírus).
Os principais clientes desistem continuamente da matéria prima brasileira. China (incluindo Hong Kong), principal importador do couro nacional, reduziu em 35% suas importações, quando comparamos os resultados do primeiro trimestre de 2019 com os de 2021. O mesmo fez a União Europeia, em 33%, os EUA em 44% e Vietnã em 26%.
Há quem aponte a concentração da demanda no mercado chinês como a principal causa do debacle setorial, recorrendo à própria cultura chinesa que ensina a não colocar todos os ovos na mesma cesta. Contudo, Andrew Carnegie questiona a lição ao sugerir que todos os ovos sejam colocados na mesma cesta, cuidando para que a cesta seja bem vigiada. Diversificação de mercado é uma alternativa, mas não é a única.
Não há como negar que nos sete últimos anos, o setor perdeu cerca de 70% do mercado internacional. Performance inimaginável e verdadeiro desastre que pode ser agravado pela dramática crise vivida atualmente pelos frigoríficos fornecedores do mercado doméstico, com possibilidade de colapso nos abates e indesejadas consequências como redução na oferta de couro e elevação de custos.
O revés setorial escapa de ser generalizado pela existência de empresas com planejamentos orientados para qualificada agregação de valor, que optaram pelo distanciamento do ganho em escala e conquistaram competitividade em nichos de crescente market share. Algumas poucas empresas vão bem, mas o setor não, reverberando em significativa discrepância com o PIB setorial global, superior a US$ 400 bilhões.
A indústria curtidora nacional foi formatada em liderança internacional ao processar cerca de 40 milhões de peles/ano em moderno parque industrial, com mão de obra de elevada qualificação. Há estrutura suficiente, portanto, para suplantar circunstanciais obstáculos.
Organização competitiva, adaptabilidade e ousadias focadas no consumidor (Não procure clientes para seus produtos. Encontre produtos para seus clientes – Seth Godin), entre outras escolhas, são capazes de reposicionar a estratégia do setor, sustentada por adequações tributárias e creditícias construídas em favor da agregação de valor e da produção de manufaturados.
Inovação, crédito e conformação tributária, desde que harmonizados e direcionados para ganhos de valor, compõem o pacote de medidas para reverter o quadro desfavorável e suportar o desenvolvimento de um cenário vencedor.
Luiz Bittencourt – Eng. Metalúrgico/UFF; M. of Eng./McGill University/Montreal/Canadá; Pós-graduado em Comércio Exterior/Universidade Mackenzie/SP; Consultor em Relações Institucionais; Diretor da LASB Consultoria –[email protected]
Hélio Mendes – Consultor de Estratégia e Gestão, professor da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, com curso de Negociação pela University of Michigan, Gestão Estratégica pela University of Copenhagen e Fundamentos Estratégicos pela University of Virginia. [email protected] – www.institutolatino.com.br