Barra do Piraí criou, nessa semana, nova categoria de funcionário público ao nomear, via decreto executivo, um cão para o serviço público municipal. A nomeação é vitalícia, “simboliza o compromisso do município com a luta pelo combate e prevenção aos maus-tratos animais” e, como deixa em aberto as funções a serem exercidas pelo novo “servidor” (farejador, por exemplo), amplia suas possíveis atuações no serviço público.
Resgatar o cão, trata-lo e conduzi-lo para a adoção é ato não só louvável, como compulsório. Mas, encerrar o processo nomeando o cão servidor público da prefeitura, que o manterá por toda a vida, é decisão discutível.
Para começar, a decisão em si pode ser considerada uma peça de marketing, alicerçada no apelo dos bons tratos animais. E até faz sentido para o atual quadro político quando a ação política no país vem continuamente se esvaindo, deslocada pelas ações de marketing. A política, que tem como alvo o cidadão, cede lugar para o marketing, que só enxerga o eleitor.
Contudo, o cidadão não deve se esquivar de algumas ponderações e a primeira delas diz respeito ao orçamento público. O novo “servidor” será mantido com recursos do contribuinte, decisão eminentemente lastreada no estado provedor, enquanto há carência de investimentos para alavancar, por exemplo, a área da saúde municipal e promover atendimento médico ao cidadão barrense. Necessário, portanto, muito cuidado do serviço público para não confundir prioridades.
É verdade que o recurso necessário para manter esse “servidor” é mínimo, irrelevante, porém, também no campo do simbolismo, representa a desimportância com que autoridades enxergam os recursos públicos.
Do lado político local, essa decisão pode ser reveladora para o próximo pleito.
Passa a impressão de que o líder político, atual comandante do executivo, pode, com o decreto, avaliar a dimensão de sua liderança, ao mesmo tempo em que testa o potencial de reação da oposição, diagnóstico que lhe fornecerá informações para o próximo desafio eleitoral.
E deixou a oposição entre a cruz e a espada. Objeção ao decreto fragilizará a oposição entre os defensores do bem estar animal, ao passo que omissão pode ser entendida como letargia. Difícil escolha.
De todo modo, a recuperação do animal e seu encaminhamento para adoção privada resolveria a questão e não envolveria comprometimento de recursos públicos.
Luiz Bittencourt – Eng. Metalúrgico/UFF; M. of Eng./McGill University/Montreal/Canadá; Pós-graduado em Comércio Exterior/Universidade Mackenzie/SP; Consultor em Relações Institucionais.
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