CORONEL HELENA É GENTE QUE FAZ!
Segurança do Governador de SP tem a 1ª mulher negra no comando em 97 anos
Natural de São José do Rio Preto, Helena Reis é a segunda mulher a chefiar a Casa Militar desde 1920. Ela assume o posto após antigo secretário deixar cargo para comandar pasta na Prefeitura.
Caçula de seis filhos de um casal baiano que se radicou no interior de São Paulo, a coronel Helena Reis, de 46 anos, é a primeira negra a chefiar a secretaria da Casa Militar em quase cem anos de existência da pasta. O placar: 51 homens x 2 mulheres nomeados desde 1920.
Helena é a nova responsável pela equipe de segurança do governador Geraldo Alckmin e do Palácio dos Bandeirantes, além da coordenação da Defesa Civil do estado. Ela assumiu o posto após antigo secretário, José Roberto Rodrigues de Oliveira, deixar cargo para comandar a secretaria municipal de segurança Urbana na gestão de João Doria.
“Apesar de estarmos em 2017 ainda causa surpresa a indicação de uma mulher negra para algumas funções na nossa sociedade. Mas eu fico feliz de poder representar as mulheres, servir de inspiração, exemplo”, afirma.
Não é a primeira vez que a atual secretária se depara com o mito da democracia racial no país. Natural de São José do Rio Preto, Helena também já foi a única negra das 15 mulheres de sua turma na Academia de Polícia Militar do Barro Branco, na década de 80. Fez parte do primeiro grupo feminino a ingressar no curso de cadetes.
Até 1988, as mulheres entravam na Polícia Militar como sargentos. Depois, era necessário prestar um concurso, fazer um curso de um ano para se tornarem oficiais, explica ela. “Nós somos as pioneiras no Barro Branco. Éramos um grupo de 15 meninas e minha turma tinha 180 homens.”
Pertencer a grupos minoritários – ou até então inexistentes – na avaliação dela, refletem características históricas, e não particularidades da escola em que se formou militar.
“Isso ainda é um problema da nossa sociedade, não de uma outra instituição. De fomentar, melhorar a educação básica, de forma que as pessoas consigam ascender com mais facilidade. São problemas históricos mesmo, que ainda a gente vê reflexo. Atribuo isso a um problema social”, avalia.
Ao longo de sua trajetória, a coronel acumulou outras exceções. Diz não se recordar de ter sofrido discriminação por ser mulher tampouco foi vítima de racismo.
“Eu nunca fui vítima de racismo, nem na carreira, nem fora dela. Eu lembro de menina, antes de entrar na polícia, algumas situações, na busca de emprego, aquele preconceito velado, a falta de oportunidade. Mas depois que entrei pro concurso público, eu percorri todas as etapas possíveis dentro da instituição. Nunca fui barrada, impedida de ocupar um cargo, uma posição”, conta.
Embora reconheça o lento ingresso de mulheres nas policias do estado, acredita que, em breve, não haverá força de segurança sem a presença feminina – inclusive na Rota, a tropa de elite da polícia paulista que não tem mulheres no policiamento ostensivo.
“Vai acontecer. Como a mulher na polícia militar veio crescendo muito, da assistente social até a chefe da Casa Militar, foi sendo gradativo. É a polícia mais antiga do Brasil, existe desde 1955. Tem lugar que ainda não tem mulher? Tem, você acabou de citar a Rota, mas eu acredito que vai ter.”
Trajetória
Filha de um sargento da Polícia Militar, Helena cogitou cursar agronomia, mas influenciada pela carreira do pai, e de um de seus cinco irmãos, que já havia replicado a profissão do patriarca, prestou o concurso do Barro Branco tão logo deixou o ensino médio.
Estudou em escola pública no interior de São Paulo, e só deixou a cidade natal para tentar a carreira militar. “Eu ingressei bastante jovem, levava uma vida em sítio, muito pacata. Foi uma transição muito grande para mim estar em São Paulo, ser policial.”
Seguiu na capital paulista após terminar os quatro anos de curso. Depois, conseguiu a almejada transferência para o interior. Trabalhou em Catanduva e ficou em São José no Rio Preto até ser promovida a tenente coronel e retonar à capital paulista para trabalhar no Estado Maior da Policia Militar – área que compreende o Comando Geral da PM – , na função de assessoria.
Das marcas dos 28 anos de militar, recorda-se do atendimento feito quando ainda estava em São Paulo, logo após se formar, a uma menina de 12 anos que havia se suicidado. “Nunca me saiu da cabeça a posição que ela estava na cama, apoiada com a corda. Às vezes ficam na memória não porque que troquei tiro. O sentimento de uma pessoa tão jovem, do desperdício de uma vida humana. Eu tinha 22 anos quando vi essa cena.”
Fora da profissão, teve que encarar a perda do irmão policial militar, morto durante uma tentativa de assalto na região de Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo.
“Ele estava em uniforme de educação física. Era o trajeto diário dele. A investigação nunca foi muito conclusiva, mas aparentemente ele interferiu em um roubo a uma casa loteria. Nunca ficou claro para a gente. (…) Foi talvez um dos piores momentos das nossas vidas. A perda ainda de forma violenta. Mas não pensei em desistir. Demorou para assimilar, é claro, tem todo um processo. Ele morreu 15 dias antes de se casar. Foi muito traumático. Ele morreu no dia primeiro de agosto e o casamento seria no dia 16 daquele mesmo mês.”
Violência
Membro da instituição que a Organizações das Nações Unidas (ONU) já recomendou que seja extinta, a coronel diz não ser cega às críticas, mas avalia as denúncias de violência policial como casos isolados e não o perfil de sua corporação.
“A gente tem 94 mil homens na polícia paulista. As ações que nós chamamos [de] não conformidade, onde um policial se excede no limite da autoridade ou no uso da força, é menos de 1%. Só que há uma inversão. Quando esses grupos criticam a atuação da polícia militar, eles pegam esse fato.”
A secretária-chefe da Casa Militar minimiza o posicionamento dos movimentos sociais e até dos órgãos internacionais. Ela considera as avaliações parciais e influenciadas pelas repercussões negativas divulgadas pela imprensa.
“As organizações internacionais na verdade se posicionam diante daquilo que é noticiado. Elas não vêm in loco passar o dia com a equipe de policiais e acompanhar o trabalho da polícia militar. Eu tive oportunidade de fazer curso nos Estados Unidos e passei dois meses e meio no FBI fazendo um curso. Acompanhei alguns procedimentos e eles são enérgicos e pronto. E ninguém questiona isso.”
Helena não apenas acredita que sua corporação seja “vital” para a sociedade como defende a função social que ela cumpre. “Eu afirmo perante qualquer grupo social que a Policia Militar é a instituição maior garantidora dos direitos humanos do nosso país. Algumas organizações falam: como isso? A Policia Militar tem uma capilaridade. O número de atendimentos sociais que a Policia Militar realiza é superior aos atendimentos criminais. Hoje a gente é de padre a médico, onde não há outras estruturas estatais a Polícia Militar está lá e acaba fazendo parto, atendimentos.”
É possível reestruturar ou acabar com a PM? “Eu acredito que não. É uma instituição que funciona, e funciona bem. Em que pese ter seus defeitos, é uma instituição necessária, eu diria vital para a sociedade. Eu tenho 28 anos de polícia e eu não consigo contar e relatar os casos em que eu auxiliei pessoas. Quem vai fazer esse trabalho? Eu não acredito em mudar o nome, ou tirar o militar. Vai ter que haver uma instituição fazendo o que nós fazemos hoje. Muitas vezes faltam outras estruturas do estado que acabam sendo supridas pela própria Polícia Militar.”
Fonte: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/seguranca-do-governador-de-sp-tem-a-1-mulher-negra-no-comando-em-97-anos.ghtml