O PODER DO ESTADO ABDUZIDO PELO JUDICIÁRIO
(1ª PARTE/ 3 PARTES)
O Poder do Estado é uno e não se divide, por isso, separação dos Poderes é uma expressão imprecisa. A separação é das Funções Estatais, não do Poder do Estado, e tem a finalidade de controlar o Poder, pelo próprio Poder, em prol da segurança dos cidadãos, evitando sua concentração em uma pessoa ou grupo.
Para isso, existem o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, uma Trindade Política compondo o Poder do Estado uno e trino, respectivamente, com funções executivas, legislativas e judiciárias. Mal comparando, pode-se fazer um paralelismo com a Santíssima Trindade.
Já pensaram o que seria da Cristandade se o Pai, o Filho e o Espírito Santo entrassem em conflito? Pois bem, o mesmo pode acontecer com o Estado, com imprevisíveis consequências para a Nação. As diferenças são que o Estado não é Deus e não é imortal, podendo sofrer intervenções, mudanças ou uma total transformação pela Nação, da qual é apenas um delegado, assim como o são as Forças Armadas (FA).
A separação confere autonomia a cada um desses “subpoderes componentes” para exercerem suas funções, evitando abusos por um dos três, daí ser imperiosa a sua harmonia. A separação das Funções Estatais atua como um sistema de freios e contrapesos. Freio, por exemplo, quando o Judiciário declara que uma lei fere a Constituição Federal (CF), agindo na contenção do Legislativo que a criou. O contrapeso resulta das funções distintas, independentes e não hierárquicas e assegura o equilíbrio entre os “subpoderes componentes”.
O País vive uma crise institucional, fruto da interferência do Judiciário nas funções do Legislativo e, principalmente nas do Executivo, comprometendo o equilíbrio, a independência e a harmonia entre os três, ao extrapolar suas atribuições. Um choque entre os “subpoderes” pode causar a falência (anomía) do Poder do Estado restando, então, apenas a força para restaurá-lo e esta quem tem são as FA, encarregadas de zelar pela sobrevivência da Nação quando ameaçada.
A operação Lava-Jato foi um marco na história recente do País. Deu-nos a esperança de um futuro mais digno, mostrou que a Nação anseia por mudanças moralizadoras na vida política e social e levou à ascensão de uma nova liderança, que não pertence aos quadros da velha e carcomida política encastelada, principalmente, mas não exclusivamente, no Legislativo e no Judiciário.
Diante da ameaça representada pelos novos tempos, a velha liderança patrimonialista fisiológica, em grande parte corrupta ou omissa diante da corrupção, reagiu e promove permanente campanha para desestabilizar e impedir o Executivo de governar.
Essa reação é o cerne do conflito, daí porque, mesmo reconhecendo haver vulnerabilidades, inabilidades, falhas e precipitações na condução da crise, no que compete ao Executivo, julgo ser ele o único “subpoder”, cuja liderança está compromissada, de fato, com os interesses da Nação.
A ingerência do STF nas funções do Executivo é clara e há muitos exemplos, inclusive, de decisões monocráticas, com viés político e partidário, exaradas por ministros sem mandato popular contra quem foi eleito com 58 milhões de votos para governar o Brasil.
Numa escalada da crise, se houver ruptura entre os “subpoderes”, a estabilidade política sofrerá um abalo de extrema gravidade, dividindo o país. De que lado ficariam vários governadores de estados da Federação? Uma cisão nesse nível ameaçaria a unidade política do Brasil.
As FA estariam diante de um impasse, porque a CF permite aos três “subpoderes” requisitar o emprego das FA para garantir a lei e a ordem. Entretanto, estando em conflito entre si, qual deles teria autoridade legítima para requisitar o emprego das FA para enquadrar o oponente, sendo uma das partes envolvidas no contencioso?
E se o Judiciário requisitar o emprego das FA, para obrigar o Executivo a cumprir uma determinação, e o Presidente da República (PR) se recusar a dar a ordem de emprego, alegando ingerência do STF nas funções do Executivo? Já houve o precedente na suposta tentativa da quebra de sigilo do celular do PR.
Haveria consenso nas FA para apoiar um deles ou elas adotariam uma posição própria? E se elas se dividissem?
(CONTINUA NA PRÓXIMA SEMANA)
General Reformado Luiz Eduardo Rocha Paiva – Ex Comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, Diretor de Geopolítica e Conflitos do Instituto Sagres e membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil.
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