Elas comandam um negócio e a própria vida. No mês em que celebramos as mulheres, a Revista conta a história de sete empresárias da capital
Com Rachel Sabino *
Nascidas, criadas ou radicadas na capital, as mulheres brasilienses se consolidam em negócios de crescimento exponencial. Umas há muitos anos no mercado, outras ainda iniciando a estrada, mas uma coisa é certa: o compartilhamento de experiências entre as gerações se mescla e faz de Brasília uma cidade de influências.
Em âmbito nacional, o número de empresárias subiu 34% nos últimos 14 anos, segundo dados do Sebrae. Em um estudo de 2017, a Rede Mulher Empreendedora (RME) — primeira plataforma de apoio ao empreendedorismo feminino do país — aponta que 55% das brasileiras donas de seu próprio negócio têm filhos e, entre elas, 75% passaram a empreender após a maternidade.
Além disso, 55% das empreendedoras anseiam por mais qualidade de vida, mas a realidade mostra que 39% delas trabalham nove horas ou mais por dia. A pesquisa também levantou que 79% das entrevistadas têm ensino superior completo e a média de idade é de 39 anos — 61% delas são casadas e 44%, chefes de família.
Em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, celebrado na próxima quinta-feira, a Revista conta a história de empresárias que têm feito diferença na cidade, no país e até no mundo. De diversas faixas etárias e campos de atuação distintos, elas têm em comum o talento e a força para o trabalho.
Dom precioso
“Sempre tive um olhar estético para tudo e, em especial, para joias.” Carla Amorim está entre os nomes mais poderosos do mercado de luxo. A brasiliense, com 25 anos de trajetória, é reconhecida nos tapetes vermelhos e nas premiações internacionais. Angelina Jolie e Michelle Obama são clientes. Esmeraldas e diamantes, deleites.Apesar do luxo, Carla é simples. Maquiagem, quase nenhuma. Serena na voz e nos gestos, está sempre com um sorriso no rosto. “Essa calma toda vem do meu pai. Costumo dizer que sou ele de saia”, brinca. Foi dele também que herdou os aprendizados nos negócios, essenciais para o êxito como empresária.
Hoje, suas joias abrilhantam o Brasil e mais 15 países, entre eles Emirados Árabes, Cazaquistão, Líbano e Rússia. A expansão deixa a designer honrada. “Fico lisonjeada de levar o nome de Brasília a tantos outros lugares. Tenho a oportunidade de fazer as pessoas conhecerem a cidade por meio das minhas peças.”
A inspiração para criar não vem só da arquitetura do Planalto Central e dos traços de Niemeyer, mas também da natureza e da fé. A primeira coleção que lançou na carreira teve peças inspiradas na espuma do mar: pequenas bolhas que se formam quando a maré encontra a areia. Os escapulários, as medalhas e os pingentes de Espírito Santo são peças sagradas para Carla, assim como sua espiritualidade, que faz questão de transparecer nas coleções. “Nunca sonhei em trabalhar com joias. Em oração, tive o discernimento que este era o meu caminho. É um dom que tenho”, declara.
Formada em letras/tradução, Carla começou desenhando por hobby. Criava peças para familiares e amigas, até que começou a fazer cursos de ourivesaria e desenhos para aperfeiçoar o chamado divino. O boca a boca foi acontecendo e ela abriu a primeira loja na cidade. Depois, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro e Recife entraram no mapa de endereços da marca.
O preço? Caro. Um brinco da coleção Black Label, por exemplo, pode custar em torno de R$ 60 mil. Contudo, os valores exorbitantes não impedem Carla de ter um leque amplo de clientes. As joias dela conquistam de políticos a funcionários públicos, de médicos a atrizes. “Tenho de tudo aqui, em qualquer época. As mulheres compram mais para si, e os homens em datas especiais — para elas.”
Segundo a empresária, a instabilidade econômica que se arrasta há anos no Brasil abalou as vendas um pouco, mas ninguém deixou de gastar. A empresa continuou lucrativa e Carla, inabalável. “Acredito que a beleza encanta e emociona a gente. É algo com que se tem afinidade. Pelo que vejo, as pessoas não param de comprar totalmente. Podem até diminuir a frequência, mas não param. Não costumamos abrir mão de algo que nos faz bem.”
Casada e mãe de gêmeos, Tiago e Felipe, Carla não dispensa tempo com a família. Caseira, sessões de filmes e séries fazem parte da rotina, além de visitas à loja no Lago Sul e a ginástica, em casa, momento em que tira um tempo só para ela. As missas diárias também estão na agenda, não importa onde esteja. “Acredito que nós temos de cuidar de tudo: corpo, mente e alma. E isso me alimenta todos os dias.”
Envolta em colares e anéis, Carla confessa: “Só uso peças minhas. Não para desmerecer ninguém, mas amo tanto o que faço, que não vejo necessidade de usar outras marcas.”
Jeito feminino de administrar
“Criamos, eu e Janete, uma empresa com inovação e qualidade, mas também repleta de cuidado, amor e confiança. O fato de ser fundada por duas mulheres, com atributos tão femininos, faz com que seja gerada uma relação de ganha-ganha e isso traz transparência. Utilizamos uma liderança compreensiva, mas que cobra resultados”, explica.
Casada, mãe de três filhos, Sandra diz que buscou inspiração na mãe, costureira que fez da profissão um grande negócio. A matriarca foi seu exemplo de coragem e empreendedorismo. “Honestidade, sinceridade, palavra, trabalho… Os valores herdados de minha família foram trazidos para o Sabin e fizeram dele um dos melhores lugares para se trabalhar no país”, entusiasma-se.
Sandra iniciou sua jornada com Janete quando ainda eram funcionárias de outro laboratório. Tudo isso se passou na época da ditadura militar, em que o cenário era repleto de machismo e pouca abertura para o empreendedorismo feminino. Hoje, ao olhar para trás, ela se orgulha de ter chegado onde chegou. “Temos 225 unidades do Sabin em várias cidades do Brasil. Contamos com mais de quatro mil funcionários e, destes, 67% são mulheres, sendo 74% de cargos de diretoria e chefia.”
De acordo com sua filosofia de vida, respeitar a cultura local é primordial. “O Sistema Integrado de Gestão do Laboratório Sabin conta com programas de acreditação e certificações. Buscamos a excelência.” Entre as certificações que conquistaram, estão a ISO 9001:2008, norma técnica que estabelece um modelo de gestão da qualidade para organizações, explica a empreendedora. Ela considera que a vida tem três tempos: o tempo de estudar, o de ganhar e o de servir.
“A vida tem três tempos: o de estudar, o de ganhar e o de servir.” Sandra Costa
Equilíbrio entre o profissional e o pessoal
O entusiasmo de Janete Vaz é contagiante. Ao falar sobre empoderamento feminino, fica claro o motivo que levou esta bioquímica de Anápolis a chegar tão longe na carreira sem sacrificar a vida pessoal. A cada palavra, expressa o quanto valoriza as mulheres como profissionais, mães de família, empreendedoras e, acima de tudo, seres humanos. “É inadiável que as mulheres cuidem delas mesmas”, fala com segurança.
Foi assim, cheia de autoconfiança, que Janete começou sua trajetória há 33 anos. Mãe de três filhos, enfrentou muitos desafios, inclusive o de dividir a maternidade com o sucesso profissional à frente do Laboratório Sabin. Ao longo da jornada profissional, muitas conquistas: a empresária foi eleita, por dois anos consecutivos (2016 e 2017), uma das mulheres mais poderosas do Brasil, pela Forbes, conceituada revista de negócios dos Estados Unidos.
“Nós, mulheres, somos boas de negócios. O que eu falo é que a empresa que permite que a mulher se apodere de seu sonho da maternidade vai mais longe.” Janete enxerga que toda mulher tem sonhos, deseja se realizar profissionalmente, mas também não quer abrir mão de ser mãe, de ter uma família, de cuidar dos filhos. Para ela, levar esse equilíbrio às suas funcionárias é fundamental. “A cultura da minha empresa é esta.”
A goiana lembra que, antes do nascimento do caçula, procurou um casal de psicólogos para saber se um dia os filhos sentiriam sua ausência por causa do excesso de trabalho e, se, no futuro, cobrariam isso dela. “Eu me sentia ausente no dia a dia, mas os terapeutas me certificaram de que, ao contrário, eu proporcionaria orgulho a eles”, recorda-se. “O exemplo que eu dava a meus filhos era superior à minha não presença constante. O pouco tempo que eu passava com eles era muito mais impactante do que passar o tempo todo”, acredita. E, assim, seguir firme nos seus sonhos.
Mãe, esposa, avó e empresária, ela ultrapassou barreiras ao se unir à amiga Sandra Costa, e, em sociedade, fundar, em maio de 1984, a primeira unidade do Laboratório Sabin, em Brasília. Com apenas três funcionários, começaram o negócio numa época em que a liderança masculina predominava e os militares estavam no poder.
Venceram juntas o preconceito com muito trabalho, investimentos e desafios. Hoje, o laboratório é referência nacional e foi eleito, em 2017, a melhor empresa brasileira para a mulher trabalhar, pelo Instituto Great Place To Work, renomada consultoria norte-americana. Há 12 anos, se mantém no ranking de melhor ambiente de trabalho do país.
Hoje, Janete Vaz se considera uma mulher realizada. Além da profissão e da família, faz parte do movimento Mulheres do Brasil, que reúne grandes empreendedoras de Brasília e de todo o país. Exemplo para tantas mulheres, é inspiração para quem quer se arriscar no universo do empreendedorismo.
“A empresa que permite que a mulher se apodere de seu sonho da maternidade vai mais longe.” Janete Vaz
O novo luxo
Gabriella Constantino pode ter sobrenome conhecido no ramo da aviação civil, mas o legado empresarial da família a inspirou a assinar o próprio negócio. Independente e mão na massa, como se autointitula, é formada em international business, na European Business School, em Londres, e tem o currículo repleto de experiências em instituições de design, como Central Saint Martins e Instituto Marangoni. Gabriella sempre teve um pé nos negócios e o outro na moda.
Visionária nesse tipo de negócio na capital, a empresária começou a receber desapegos de amigas e conhecidas e passou a revendê-los. Dona de um estilo vintage impecável, tem gosto por brechós desde cedo: a prioridade nas compras sempre esteve em peças de segunda mão. De repente, o que era paixão e hobby virou trabalho.
Na vitrine virtual, há Chanel, Balenciaga, Dior, Hermés, Gucci, só para citar algumas das mais de 100 grifes em estoque, que somam cerca de 1.300 produtos disponíveis para compra. “Vendemos bolsas, sapatos e roupas por menos da metade do preço da loja”, garante. Quem deixa uma peça com Gabriella recebe de 35% a 45% do valor atribuído ao produto.
Todas as peças são avaliadas e passam por uma curadoria de qualidade e autenticidade. Todos os dias, a equipe vai aos Correios despachar os pedidos feitos no site, os quais aumentaram exponencialmente devido à parceria com a blogueira Thássia Naves, que se desapegou de quatro peças e as deixou para venda no e-commerce.
O Prettynew, além de dar passe livre ao luxo, tem uma identidade que, para Gabriella, é primordial: a sustentabilidade e o engajamento social. “Sempre acreditei que meu trabalho pudesse ser algo positivo e que mudasse a realidade de alguma forma”, afirma.
Ao revender os produtos antes esquecidos no armário, Gabriella movimenta a economia e aumenta a vida útil das peças, o que carinhosamente chama de reciclar moda. Parte das vendas também é revertida para a instituição paulista Nino Itaci e, recentemente, a empresa se comprometeu a apoiar o projeto Kaabu, que tem como objetivo valorizar a arte indígena e promover geração de renda para a comunidade local por meio de incentivos de trabalhos manuais das índias Wai Wai.
Com o passaporte carimbadíssimo, resultado de várias andanças pelo mundo, Gabriella planeja voar alto com o Prettynew. Em dois meses, a equipe se muda para um estabelecimento próprio, projetado para o funcionamento integral do showroom — hoje localizado em um espaço temporário na QI 13 do Lago Sul. Além de expansão na cidade, roteiros internacionais já estão traçados. “Tenho o sonho de abrir uma sede nos Estados Unidos. Assim que estivermos mais consolidados aqui, levarei o Prettynew para Nova York.”
“Quero e vou ser o maior e o melhor site de vendas de luxo do Brasil.” Gabriella Constantino
Consumo personalizado
Adriana Lima é sinônimo de empoderamento feminino: negra, cheia de energia, criatividade e ousadia. Moradora de Ceilândia, aos 39 anos, essa sagitariana vibrante conta sua história com muita alegria e orgulho. “Comecei a trabalhar cedo, aos 14 anos. Já vendi produtos de revista, fui recepcionista, coordenadora de cursinho, de marketing, e estou sempre em busca de aprimoramento intelectual. Conhecimento nunca é demais”, diz.
O que chama a atenção em Adriana é a sua facilidade em se comunicar com todas as tribos, com o mundo, com o consciente e o inconsciente das pessoas. Foi por meio das redes sociais e de um blog que ela decidiu empreender e criar sua empresa. “Sempre fui uma influenciadora de pessoas. Adoro produzir e empreender”, resume.
A partir daí, nascia a Sacoleiros de Luxo. “Resolvi fazer do entrave um recomeço. Comecei a minha marca com pesquisa. E tem dado certo”, conta. Criando conceitos e novidades, Adriana usa formas, cores e inspiração nas marcas para atender seu público de forma personalizada e única. “Produzo coleções em variados materiais e modelos, de canecas, almofadas, quadros, capinhas de celular, roupas, tudo de acordo com o que o cliente deseja.”
A marca Sacoleiros de Luxo deu origem a uma loja virtual que faz sucesso no Brasil todo. Adriana é famosa por combinar qualidade e celeridade na entrega dos produtos. A empresária diz que seu público é muito variado. “As pessoas sonham e eu pesquiso, desvendo e crio de acordo com o desejo de consumo de cada uma”, afirma. Adriana é adepta do e-commerce: vendas somente on-line, sem necessidade de uma loja física.
A primeira heroína e referência da empresária é a mãe, exemplo de empreendedora. “Nós, mulheres, nascemos para ser o que queremos ser.” Ela considera a liberdade e a independência femininas uma conquista sem precedentes para a atual e a próxima geração.
Hoje, Adriana pensa em dividir um pouco do que aprendeu. “Quero influenciar outras mulheres a buscar também os seus sonhos.” O objetivo da empresária é, por meio de sua marca, apoiar e construir projetos que envolvam moda, beleza e empoderamento feminino. “Movimentar-se no mundo, buscar novidades e transitar com a cabeça erguida é o que todas nós merecemos”, declara.
“Nós, mulheres, nascemos para ser o que queremos ser.” Adriana Lima
* Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/revista/2018/03/04/interna_revista_correio,663440/empresarias-de-brasilia-fazem-a-diferenca-nas-areas-que-atuam.shtml